CNN: Teoria anti-China de Trump é desmascarada

Fonte: Diário do Povo Online    09.05.2020 16h13

A grande mentira do governo Trump é que a China é a causa dos problemas da América. O “meme” tem funcionado, uma vez que joga a favor da presunção americana de que, se a China for bem-sucedida, é porque estão trapaceando.

Trump e seus aliados de direita melhoraram esse jogo recentemente, alegando que a pandemia de Covid-19 resultou de uma fuga acidental de um laboratório chinês e que o "encobrimento" da China bloqueou uma resposta global eficaz.

Segundo a CNN, as descobertas ainda secretas das agências de inteligência Five Eyes (EUA, Reino Unido, Austrália, Nova Zelândia e Canadá) despejam água fria sobre essas alegações. O mesmo acontece com o especialista em doenças infecciosas de Trump, o Dr. Anthony Fauci.

No entanto, no domingo passado, o secretário de Estado Mike Pompeo afirmou: "Há uma quantidade significativa de evidências de que o vírus provém daquele laboratório em Wuhan".

Tais acusações da administração Trump e do senador Tom Cotton, do Arkansas, são imprudentes e perigosas. Elas podem levar o mundo ao conflito, tal como as mentiras do governo Bush sobre as armas de destruição em massa no Iraque levaram os EUA à guerra em 2003.

Se as alegações do governo Trump forem descartadas pelas agências de inteligência e por análises científicas independentes, como agora parece provável, elas lembram o fim da era McCarthy.

Trump é o atual senador Joseph McCarthy, que usa mentiras e insinuações para induzir os americanos à submissão. O notório advogado de McCarthy, Roy Cohn, que era um mentiroso patológico, era advogado e mentor de Trump.

McCarthy não conhecia limites para as suas mentiras e acabou alegando que o exército dos EUA era moderado com os comunistas. O exército expôs as mentiras de McCarthy e, em palavras perenes, o advogado do exército, Joseph Welch encerrou a carreira de McCarthy. "Até este momento, senador, acho que nunca realmente compreendi a sua crueldade ou imprudência ... Você já fez o suficiente. Não tem nenhum sentido de decência?"

As acusações de direita contra a China não fizeram sentido. Primeiro, alguns membros da direita americana acusaram o coronavírus de ser uma arma biológica chinesa, uma alegação que foi rapidamente refutada pelos cientistas ao analisar o vírus. Em seguida, acusaram o vírus de ter acidentalmente vazado do Instituto Wuhan de Virologia, tendo tal situação sido subsequentemente encoberta. Isso também é ilógico.

O vírus esteve em circulação em Wuhan por semanas e acabou matando milhares de chineses. Na confusão da época, as autoridades de Wuhan organizaram um grande evento de Ano Novo, em 18 de janeiro, que contribuiu para espalhar o vírus. Porque haveriam as autoridades chinesas de ter feito isso se soubessem que estavam encobrindo o vazamento de um vírus semanas antes? A resposta real é que, quase certamente, estavam ainda na neblina da guerra contra o novo coronavírus.

De fato, nem a biologia nem a cronologia apoiam a história do vazamento do laboratório. Os biólogos observam que o laboratório de Wuhan nem possuía o sequer o vírus da Covid-19 em estudo. O coronavírus é do tipo que origina em morcegos, mas a Covid-19 pode ter um hospedeiro intermediário para mamíferos, talvez um que fosse comercializado no mercado de animais vivos de Wuhan, implicado na maioria dos casos com início antes de 1º de janeiro de 2020. O mercado de Wuhan foi encerrado em 1º de janeiro após o surto inicial. Talvez venhamos a saber que os primeiros casos em seres humanos nem sequer foram em Wuhan e foram levados ao mercado por um indivíduo infetado proveniente do ocidente da China.

Além da reivindicação da fuga do laboratório, a administração e a imprensa de direita também acusaram a China de encobrir o surto ao longo de semanas. No entanto, considere os registros. Os médicos de Wuhan notaram casos incomuns de pneumonia viral em meados de dezembro. As autoridades de saúde de Wuhan notificaram o escritório da Organização Mundial da Saúde na China em 31 de dezembro. A agência de saúde da China ligou para o CDC dos EUA em 3 de janeiro. O genoma foi totalmente sequenciado e publicado on-line em 11 de janeiro, e Wuhan foi trancada em 23 de janeiro.

Dada a inevitável confusão inicial sobre uma nova doença que nunca havia sido vista antes, trata-se de uma linha temporal rápida. Houve erros? Em 30 de dezembro, o Dr. Li Wenliang enviou aos colegas médicos um aviso de um novo surto semelhante à SARS. O seu corajoso aviso estava correto em essência, mesmo que a doença tenha sido nova. No entanto, o Departamento de Segurança Pública de Wuhan forçou o Dr. Li a assinar uma declaração admitindo que estaria perturbando a ordem pública.

Tragicamente, o Dr. Li sucumbiu à doença em fevereiro. Em março, ele foi exonerado por uma investigação nacional. Além disso, as autoridades chinesas esperaram até 20 de janeiro para declarar definitivamente que o vírus transmitia entre seres humanos. Isso também foi um erro, um atraso trágico de vários dias que pode ter resultado de uma esperança incorreta e irrealista de que o encerramento dos mercados de animais vivos de Wuhan interrompesse a doença, ou de incertezas mais gerais, ou um desejo de não atrapalhar o início do processo.

Mas, em vez de reconhecer a rapidez que culminou no confinamento em 23 de janeiro, Trump jogou rápido e frouxamente com os fatos, atingindo a China a cada momento. Mas isso tem sido hábito na luta de Trump contra a China. Por exemplo, o governo afirmou repetidamente que a Huawei e outras empresas chinesas de alta tecnologia são ameaças diretas à segurança dos EUA, sem fornecer nenhuma evidência direta. É por isso que os aliados mais próximos dos EUA, como o Reino Unido e a Alemanha, seguiram uma direção diferente, continuando a fazer negócios com a Huawei e a cooperar, de modo geral, com a China.

O foco principal da epidemia e do fracasso sombrio de Trump é este. Em 31 de dezembro de 2019, a China notificou a OMS. Em 23 de janeiro, a China isolou Wuhan. Em 30 de janeiro, a OMS declarou uma emergência global de saúde pública.

Em 30 de janeiro, ainda não havia uma única morte por Covid-19 nos Estados Unidos. Pensa-se agora que a primeira ocorreu em 6 de fevereiro.

Agora, existem mais de 71.000 mortes nos EUA.

Houve muitos avisos, Srs. Trump e Pompeo. Até o momento, os americanos não avaliaram totalmente a sua imprudência. Você já mal que chegue. Não tem vergonha?

 

Nota: o presente texto de opinião, da autoria de Jeffrey D. Sachs, foi publicado na CNN no dia 6 de maio de 2020. 

(Web editor: Renato Lu, editor)

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