Por Mauro Marques
Enshi, um município no sudoeste da província de Hubei, foi afetado pela epidemia de Covid-19 que começou a alastrar-se na China a partir de Wuhan.
Todavia, para os habitantes locais, isso são já águas passadas. As tradições regressaram e velhos hábitos foram restituídos à normalidade de sempre.
Veja-se o exemplo de Wan Qizhen que, aos 79 anos de idade, continua mantendo uma promessa de família numa pequena povoação nas montanhas que circundam Enshi.
Conta o ancião que a sua família escapara às cheias de Jingzhou e que a população do vilarejo montanhoso havia oferecido um lote de terra para garantir a subsistência dos refugiados.
Como agradecimento, a família de Wan comprometeu-se a cruzar de barco um riacho local de forma gratuita para todos os membros da aldeia, poupando aos locais o esforço de andar até à ponte mais próxima. Qizhen, aos 79 anos, faz parte da 3ª geração que respeita essa missão e o seu filho, que entretanto voltou às raízes após uma temporada a trabalhar na província de Zhejiang, já disse estar pronto para dar continuidade à honra da família.
A alguns quilômetros, volta a ter lugar o Festival Nv’er da minoria étnica tujia. Todos os anos no 12º dia do 7º mês do ano os jovens desta minoria reúnem-se na aldeia de Baiyangping para realizarem encontros amorosos, cantarem músicas tradicionais e realizarem eventos culturais.
A edição deste ano foi mais efusiva do que é habitual, pois foi para muitos especial regozijo poder esquecer as máscaras e voltar a socializar, pelo menos ao ar livre, sem as preocupações da pandemia.
À noite, como reza a tradição, todos dançam à volta de uma fogueira, se bem que nos últimos anos, a tecnologia funde-se com os velhos hábitos. Djs, música em alto e bom som, bancas de churrasco. Enfim, não faltam ingredientes para a boa disposição.
Não existe quase recanto na China onde o chá, a bebida nacional, não seja apreciado ou cultivado. Os confins de Hubei não são exceção. Aqui se confeciona o afamado chá verde Enshi Yulu.
Ao fim da tarde, defronte de uma loja geracional deste chá, ressoa uma música agitada de uma coluna possante. Por trás do aparelho, uma paisagem montanhosa idílica, encoberta por uma névoa feérica quase translúcida. O ar invade os pulmões com o aroma da natureza.
Lentamente, chegam ao local carros, motas e pessoas a pé. Avós, filhos, netos, todos têm lugar. Se as pernas não têm o vigor de outros tempos, não faz mal, há cadeiras e leques para assistir sentado. Todos dançam energicamente, sem qualquer constrangimento. Pandemia? Coisa do passado.
Dentro da loja forasteiros de Beijing degustam o chá e ouvem atentamente todas as nuances da produção deste chá que, diz o líder da empresa orgulhosamente, felizmente escapou aos estragos causados na economia pelo vírus.
Estes são alguns testemunhos de uma vida que retomou a normalidade, de um povo que procura encarar o futuro com otimismo e que retira um prazer redobrado em reencontros sociais e no reatar de tradições suspensas.