O governo brasileiro não se retirará das negociações com os Estados Unidos, apesar da ameaça do presidente Donald Trump de impor uma tarifa de 50% sobre todas as exportações brasileiras a partir de 1º de agosto, afirmou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, na segunda-feira.
Em entrevista à rádio CBN, Haddad enfatizou que as instruções do presidente Luiz Inácio Lula da Silva são para manter o canal diplomático aberto e não apresentar argumentos que justifiquem sanções unilaterais. "O Brasil não sairá da mesa de negociações. A orientação do presidente Lula é não dar motivos para sofrer esse tipo de sanção. A Vice-Presidência, a Fazenda e o Itamaraty estão comprometidos com o diálogo", afirmou.
O ministro confirmou que duas cartas já foram enviadas ao governo americano, uma em maio e outra na semana passada, mas ainda não houve resposta. "Insistiremos em negociações comerciais para encontrar um caminho de aproximação entre dois países que não têm motivos para se distanciarem", acrescentou.
Ao mesmo tempo que insiste no diálogo, o governo brasileiro também trabalha em planos de contingência para apoiar os setores mais afetados caso a medida anunciada por Trump seja finalmente implementada. Um grupo interministerial prepara propostas que serão apresentadas ao presidente Lula nos próximos dias.
Entre as alternativas em análise estão a aplicação da Lei da Reciprocidade e mecanismos de apoio econômico. No entanto, Haddad esclareceu que essas medidas não implicariam necessariamente em aumento dos gastos públicos, pois instrumentos como linhas de crédito poderiam ser utilizados, como ocorreu na resposta às enchentes no Rio Grande do Sul.
"O presidente nos pediu para desenhar todos os cenários possíveis, desde a eventual abertura de negociações até a ausência de resposta em 1º de agosto. Não podemos descartar esse cenário, embora não seja o único considerado", explicou Haddad. "Temos um plano de contingência para qualquer decisão que venha a ser tomada pelo presidente da República", acrescentou. Haddad deixou claro que o governo não busca aplicar sanções "em espécie" contra os Estados Unidos ou empresas americanas, mas ressaltou que o Brasil avaliará seu arcabouço legal e agirá dentro de suas possibilidades para defender seus interesses.
Segundo o ministro, outros países também estão sendo afetados pelos aumentos de tarifas americanas, mas, no caso do Brasil, há um componente político adicional: a relação pessoal entre Trump e o ex-presidente Jair Bolsonaro. "Há uma peculiaridade brasileira, que é a existência de uma força política de extrema direita que atua contra os interesses nacionais", afirmou.
Haddad lembrou que o Brasil tem déficit comercial com os Estados Unidos e que isso está "longe de ser um problema" para o país norte-americano. "Estive com autoridades americanas pelo menos dez vezes este ano. Há apenas dois meses, conversei com o Secretário do Tesouro na Califórnia sobre a injustiça de uma tarifa de 10%. Ele se mostrou aberto ao diálogo. O que mudou desde então para que uma tarifa de 50% seja anunciada agora?", questionou o ministro.
Para Haddad, a mudança na política comercial americana pode estar diretamente ligada à relação entre Trump e Bolsonaro. "Estamos com problema específico no Brasil: tem uma família no Brasil com prestígio na sociedade e concorrendo contra os interesses nacionais", afirmou.
O ministro também se mostrou surpreso com o anúncio de Trump de que investigaria o sistema de pagamento instantâneo brasileiro, o Pix, que descreveu como uma inovação bem-sucedida e sem custos para os usuários. "Como o Pix pode representar uma ameaça a um império?", questionou Haddad.