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Diplomacia cultural bem-sucedida: um exemplo no relacionamento Portugal-China

Fonte: Diário do Povo Online    08.08.2019 16h47

Por Pedro Sobral

Num artigo datado de 13 de junho de 2019, Eleanor Albert reconheceu a formação daquilo a que denominou um “Elo China-Portugal”. De facto, é amplamente reconhecido que Portugal parece ser um dos países europeus que tem da China uma imagem mais positiva. O país ibérico tornou-se o primeiro da zona euro a emitir a sua dívida em divisa chinesa a 2 de maio; segundo dados do Ministério do Comércio chinês, o comércio bilateral entre os dois países superou os 6 biliões de dólares em 2018, perfazendo um aumento anual de 7,4%.

Também o vínculo histórico com Portugal é mais forte do que o que une a China a outros países ocidentais. Exploradores portugueses foram os primeiros a alcançar o Império do Meio por via marítima no século XVI, tornando Portugal o primeiro país europeu a estabelecer uma relação comercial regular com a China. Talvez mais importante, o corrente ano marca o 40º aniversário do estabelecimento de relações diplomáticas entre a República Popular da China e a República Portuguesa, bem como o 20º aniversário da retrocessão de Macau. Foi neste contexto que decorreram várias atividades culturais conjuntas, uma das quais a exposição “O País das Cidades Vidradas - 500 anos do Azulejo em Portugal” (em chinês 釉彩国度 - 葡萄牙 瓷板画500年), em exibição no Museu da Cidade Proibida em Beijing entre os dias 11 de junho e 7 de outubro de 2019.

O azulejo é, nas palavras da Ministra da Cultura de Portugal Graça Fonseca, “um elemento emblemático da nossa cultura”, bem como “testemunho do contacto pioneiro que Portugal estabeleceu com o oriente e, em especial, símbolo feito arte da profunda influência que o conhecimento da cultura chinesa terá entre nós”. Constitui, por conseguinte, um excelente exemplo de produto transcultural, fortemente influenciado por motivos orientais e técnicas chinesas de fabricação de porcelana.

Observando o azulejo por este prisma, podemos ver como esta exposição se reveste de grande significado e importância para o diálogo intercultural entre a China e Portugal. Através dela, os dois países são capazes de estabelecer um diálogo cultural verdadeiramente bilateral, que serve não apenas para demonstrar aos portugueses o impacto e o papel da cultura chinesa no seu património cultural, ao mesmo tempo que permite também aos chineses observar como o engenho chinês foi aproveitado e adaptado por um outro povo, de modo a produzir algo completamente novo.

Ao explorar e evidenciar o que tem de comum e o que construiu em conjunto com o ocidente, a China seria capaz de promover não apenas uma “comunidade de destino comum”, mas também uma “comunidade de história compartilhada com a Humanidade”. A liderança chinesa provou ter consciência do potencial de evidenciar o papel da China no avanço da Humanidade como um todo. A utilização da Rota da Seda histórica para batizar e promover o seu ambicioso projeto de interconetividade é um testemunho do rico legado cultural desse elo civilizacional que ligava oriente e ocidente e no qual a China tinha um papel basilar.

A abordagem poderia, porém, ser ampliada para abarcar interações bilaterais com outros países, e não apenas europeus, a fim de melhor inserir a China num legado cultural global e mostrar aos povos ocidentais e chinês que, assim como cooperaram e alcançaram grandes realizações no passado, é possível fazê-lo novamente no futuro.

Ao invés de encararmos a História como repositório de inimizades e ressentimentos passados, podemos tentar olhar para ela como estando repleta de grandes feitos e conquistas, muitos deles resultantes de esforços conjuntos de diferentes civilizações, que beneficiaram toda a Humanidade. 

(O autor é mestre em Estudos Asiáticos pela Universidade do Minho)

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