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Entrevista com Jorge Torres Pereira, embaixador de Portugal na China (2)

Fonte: Diário do Povo Online    10.05.2016 14h30
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DPO: No ano passado foi inaugurado o Prémio Tomás Pereira. Quais as motivações para a criação deste projeto?

Embaixador Jorge Torres Pereira: Eu quando aqui cheguei sabia que, há uns anos atrás, a embaixada estava de alguma forma associada a premiar os melhores estudantes de português. Não sei exatamente qual era o escopro de universidades que era abarcado nessa iniciativa, mas esse projeto veio a perder relevância, e eu achei que era muito boa ideia, como motivação para os estudantes chineses, terem um propósito adicional para alcançarem a excelência no seu trabalho de aprender português. Ao mesmo tempo, nessa altura, há cerca de dois anos, quando comecei com esta ideia, gostava também - e continuo ainda muito interessado - em fazer lembrar a figura de Tomás Pereira - Xu Risheng - porque efetivamente estou convencido que ele é ingratamente pouco conhecido. Sendo uma figura notável que, nos últimos anos, tem tido um acervo muito importante de trabalhos científicos sobre a sua vida, sobre os seus contributos de diplomacia, música, astronomia… Eu, portanto, vi que seria interessante, como forma também de promover a sua figura, dar o seu nome ao prémio que a embaixada atribui aos melhores alunos de português. Devo dizer que parece-me particularmente importante que todas as universidades chinesas estejam convidadas a participar, e que tivemos o ano passado, na primeira edição, creio que 54 candidatos provenientes de praticamente todas as universidades chinesas onde se ensina português. Este ano devemos fazer a segunda edição. Conseguimos apoios de universidades portuguesas para receberem os vencedores como bolseiros. Também contámos com a ajuda da China Three Gorges, concluindo assim o mecenato necessário para tornar este prémio possível.

DPO: Este revivalismo de figuras histórias é então para manter…

Embaixador Jorge Torres Pereira: Eu não diria um revivalismo de uma figura histórica. Nós hoje em dia estamos muito interessados no lado da cooperação científica, da inovação e das trocas entre a Europa e a China. É extremamente importante verificar-se que aquele período da chegada dos primeiros matemáticos e cientistas - que eram também jesuítas, e que estiveram aqui em Pequim - foi um momento particularmente importante do relacionamento da Europa com a China. É também muito importante na história das ciências. Foi a altura em que houve realmente uma interação entre aquilo que o ocidente tinha para mostrar e falar com uma elite que o soubesse ouvir. Do mesmo modo, havia na China uma elite que percebeu que havia o interesse do aporte por parte dos cientistas ocidentais. E por isso, a minha ideia de sublinhar o Tomás Pereira não é uma ideia de revivalismo nem de passado, mas, pelo contrário, de ser um exemplo do que é uma perspetiva de inovação, uma perspetiva de encontro entre ciência e é por este motivo - é claro que nós na nossa atividade diplomática gostamos sempre de ter símbolos e datas – que penso que a figura do Tomás Pereira merece realmente ser conhecida. Não por revivalismo, mas porque é um paradigma da atitude correta tida aquando do encontro entre as duas civilizações.

DPO: Com as relações económicas cada vez mais profundas (adesão ao BAII, privatizações, vistos gold, etc) e agora com a proposta chinesa “Um Cinturão e uma Rota”, quais as perspetivas futuras do relacionamento económico entre os dois países?

Embaixador Jorge Torres Pereira: Eu tive a satisfação de constatar realmente uma nova dinâmica nas relações económicas bilaterais, sobretudo a partir do momento em que houve aqueles grandes investimentos. Primeiro os investimentos de empresas públicas chinesas no setor energético, e depois também dos grupos privados, nomeadamente no setores dos seguros e financeiro. A estes juntam-se investimentos que já havia de longa data, talvez de menor dimensão, mas de grande importância pela relação em termos tecnológicos, que foram as empresas do setor das telecomunicações. A verdade é que os investimentos são de tal maneira interessantes e corresponderam quase que ao início da primeira vaga de internacionalização de empresas chinesas que eu, às vezes, evidentemente que a brincar, digo que Portugal quase que é uma zona piloto do investimento chinês na Europa. Isto é, as empresas chinesas não sabiam bem, em relação à Europa, como era o quadro regulatório em que iam trabalhar, ou como se processavam as relações entre a administração e os outros atores do dia-a-dia da vida de uma empresa. Nós tínhamos algum know-how em gestão que creio que tem sido útil para os investidores chineses e, portanto, penso que agora, que cada vez há mais notícias de empresas chinesas a instalarem-se na Europa, também damos um contributo para esse processo. Processo que é um investimento um pouco diferente daquele que a China fazia, por exemplo, em África ou na América Latina. Este é um tipo de investimento diferente em que há, efetivamente, também aqui, uma aprendizagem mútua. Até porque os chineses compreenderam que o investimento em Portugal é também um veículo, uma plataforma, para aprofundar relações com empresas situadas noutras geografias, nomeadamente na geografia lusófona. Estou efetivamente muito otimista em relação ao desenvolvimento das relações quer de investimento quer comerciais.

DPO: Macau sempre foi detida como uma plataforma por excelência do intercâmbio cultural e comercial entre a China e a lusofonia, nomeadamente com Portugal. Há algum plano para diversificar os canais de comunicação entre Portugal e a China no futuro?

Embaixador Jorge Torres Pereira: No plano cultural há um dado importante, que é o de ambas as partes estarem num processo de abrir centros culturais nas capitais dos dois países. É um projeto que creio que é importante e que responde parcialmente à pergunta. As autoridades chinesas vão abrir um centro cultural em Lisboa, e nós iremos abrir um centro cultural português em Pequim. E, portanto, eu acredito que isso vai servir também para rebalancear o que é, digamos, a oferta cultural portuguesa para audiências chinesas. É claro que em Macau as coisas são mais simples porque também há, digamos, uma audiência já predisposta para o consumo de produtos culturais portugueses… mas é evidente que a China é um grande país. Nós, Portugal, precisamos que haja mais conhecimento sobre o nosso país na China… é lógico que a cultura é um argumento muito importante, e terá que ser, efetivamente, divulgada ao nível das províncias e das diferentes regiões. Evidentemente que tudo será complementar e supletivo. Não podemos imaginar que o conhecimento cultural sobre Portugal possa ser apenas aquele que nós conseguimos gerar em Macau.

DPO: Gostávamos de reservar este espaço final para alguma consideração que entenda ser pertinente referir.

Embaixador Jorge Torres Pereira: Gostava de salientar a importância de estarmos a comemorar o dia 5 de maio, que resultou de uma decisão de uma cimeira da comunidade dos países de língua portuguesa. É um dia que é simultaneamente internacional da língua e da cultura dos países da CPLP. Gostava de, publicamente, congratular-me com a presença dos meus colegas dos países de língua portuguesa, e de ter também conseguido criar aqui uma espécie de momento caloroso de relação entre todos esses países.

Por Mauro Marques 


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