Nota do editor: na semana passada o Ministério do Comércio da China anunciou que as empresas chinesas cessaram a compra de produtos agrícolas americanos, após a ameaça de Washington de impor 10% em tarifas sobre um novo lote de $300 bilhões de produtos chineses. Dois especialistas partilham a sua visão sobre a questão com Yao Yuxin, do jornal China Daily, expostas abaixo.
Queda de exportações irá atingir agricultores estrangeiros
A decisão das empresas chinesas de suspender a compra de produtos agrícolas, principalmente grãos de soja, laticínios, sorgo e carne de porco, irá representar um profundo ataque aos agricultores e comerciantes estadunidenses.
A escalada do conflito comercial entre as duas maiores economias do mundo afetou as exportações estadunidenses de produtos agrícolas para a China, especialmente de grãos de soja. A China importou $9,1 bilhões de produtos agrícolas americanos no ano passado, face a $19,5 bilhões em 2017, de acordo com a American Farm Bureau Federation.
Pequenos agricultores na China incorrem em custos mais elevados face aos seus homólogos estadunidenses para cultivarem alguns produtos, especialmente a soja, pois a agricultura é mecanizada nos EUA. Como tal, apesar dos custos de transporte, os produtos americanos são ainda mais competitivos nos mercados globais.
A importação de produtos agrícolas americanos em grandes quantidades é também resultado da divisão internacional de trabalho e das regras de comércio internacionais, as quais a China segue estritamente e os EUA violam constantemente.
Uma vez que a administração estadunidense se recusa a vender produtos de alta tecnologia para a China sob o pretexto de defender a segurança nacional, existem poucos produtos americanos, tais como produtos agrícolas, que a China pode comprar para reduzir o défice comercial entre os dois países.
Ao alavancar uma guerra comercial, porém, os EUA tornaram mais difícil para a China comprar produtos agrícolas estadunidenses em grandes quantidades.
Ainda assim, o corte da entrada de produtos agrícolas dos EUA não irá causar uma escassez de fornecimento na China, pois o país pode importar tais produtos, principalmente a soja, de outros países como o Brasil e a Argentina, suprindo a demanda doméstica. A decisão da China de importar mais soja da Rússia irá, até certo nível, ajudar a preencher a lacuna criada pelo decréscimo das importações americanas.
A administração americana continua a subsidiar agricultores e rancheiros que enfrentam dificuldades para conseguir lucros. No entanto, estes agricultores prefeririam comercializar em um mercado aberto para conseguir os seus lucros, ao invés de sobreviverem dependentes de subsídios
Han Qi é um professor reformado da Escola de Comércio Internacional e Economia, Universidade Internacional de Negócios e Economia
Mecanizar o setor agrícola para aumentar a produtividade
Quando a China concordou em comprar mais grãos de soja dos EUA, muitos viram a situação como um sinal do melhoramento das relações bilaterais. Mas após os EUA terem ameaçado com a imposição de 10% em tarifas sobre outros $300 bilhões de produtos chineses e, em resposta, a China ter suspendido a compra de produtos agrícolas americanos, o futuro das negociações bilaterais entrou em hibernação.
De fato, a compra de soja americana não é mais um problema comercial – ela se tornou uma questão política. A China não enfrenta a escassez de produtos agrícolas. O país tem reservas suficientes de produtos e tem vindo a diversificar as suas fontes de importações desde o ano passado, tendo sido bem-sucedida até à data.
Como tal, de cada vez que a China se compromete comprar mais produtos agrícolas dos EUA, incluindo a soja, as empresas chinesas têm de importar produtos adicionais. Ainda assim, Beijing tem sido sincera nos seus esforços par a finalizar um acordo comercial com Washington e melhorar os laços bilaterais.
Todavia, agora que as empresas chinesas suspenderam a compra de produtos agrícolas americanos, um duro golpe será imposto aos agricultores estadunidenses, os quais testemunharam já uma queda nas suas exportações devido à guerra comercial que dura há mais de um ano.
É verdade que os subsídios do governo Americano podem, em parte, cobrir as perdas dos agricultores. Mas será que isso irá compensar pelos lucros que poderiam ter?
Mais importante ainda, os EUA não podem verdadeiramente forçar a China a comprometer os seus interesses basilares.
A guerra comercial sino-estadunidense interrompeu em larga medida as trocas agrícolas, não obstante, é mais fácil para as empresas chinesas buscar outros fornecedores que para os agricultores americanos encontrarem mercados lucrativos alternativos.
A guerra comercial é também uma lição para a China: o país tem de empreender medidas efetivas para mecanizar o seu setor agrícola, de modo a aumentar a produtividade nacional.