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Sonda chinesa Chang'e-4 faz pouso histórico no lado escuro da Lua

Fonte: Xinhua    04.01.2019 13h19

Beijing, 4 jan (Xinhua) -- Não há ventos nem chuvas lá, apenas meteoritos cadentes que ocasionalmente rompem a quietude. O panorama desolado no lado escuro da Lua --nunca visível desde a Terra-- esperou bilhões de anos para receber o primeiro visitante terrestre.

Depois de orbitar a Lua por mais de 20 dias, a sonda Chang'e-4, lançada desde o Centro de Lançamento de Satélites de Xichang, no sudoeste da China, em 8 de dezembro de 2018, viu inúmeras crateras, montanhas e vales na Lua.

Finalmente, seu destino no lado escuro, a Bacia do Pólo Sul-Aitken (SPA), a maior, mais profunda e mais antiga cratera no sistema solar, foi iluminada pelo sol em ascensão.

Os desenvolvedores da Chang'e-4 decidiram nesta quinta-feira que era a hora de pousar o veículo neste mundo estéril.

Às 10h15 de manhã, um motor de propulsão variável foi ligado com a assistência do satélite de retransmissão Queqiao (Ponte de Pegas), que está na órbita de halo em torno do segundo ponto lagrangeano (L2) do sistema Terra-Lua, a cerca de 65 mil km da Lua, onde ele pode ver tanto a Terra como o lado escuro da Lua.

A velocidade relativa da Chang'e-4 contra a Lua foi rebaixada de 1,7 km por segundo para perto de zero, e a sonda foi ajustada para encarar a Lua e desceu verticalmente para a Cratera de Von Karman na Bacia SPA.

Quando chegou a uma altitude de cerca de 2 km, suas câmaras capturaram as sombras das colinas e vales na superfície lunar. Seu computador identificou e avaliou obstáculos grandes como pedras e crateras, para que a sonda os evitasse.

Na altura de 100 metros, a sonda pairou para detectar obstáculos menores e medir os declives na superfície. Seu computador calculou novamente e selecionou o local mais seguro.

A 2 metros acima da superfície, o motor desligou. O pousador dourado com um veículo explorador prateado a bordo aterrissou na superfície desolada cinza com quatro pernas estendidas, levantando poeira.

A sonda completou o processo inteiro de pouso, que durou cerca de 12 minutos, sem intervenção do controle da Terra. O satélite de retransmissão enviou as primeiras fotos do lado escuro da Lua para um centro de controle em Beijing.

A Administração Nacional Aeroespacial da China anunciou mais tarde que a sonda pousou na área de aterrissagem pré-selecionada a 177,6 graus de longitude leste e 45,5 graus de latitude sul no lado escuro da Lua.

"É um importante marco para a exploração espacial da China", disse Wu Weiren, projetista-chefe do programa de exploração lunar chinês.

"É uma demonstração perfeita da inteligência humana", comentou Jia Yang, vice-projetista-chefe da sonda Chang'e-4, da Academia Chinesa de Tecnologia Espacial (CAST).

Batizado com o nome da deusa da Lua chinesa "Chang'e", o programa de exploração lunar da China, que começou em 2004, inclui em orbitar e pousar na Lua e levar amostras de volta para a Terra.

Depois que a Chang'e-3 completou o primeiro pouso suave da China na Lua em 2013, os especialistas espaciais do país traçaram objetivos mais altos, esperando que a Chang'e-4 possa executar tarefas sem precedentes e mais desafiadoras.

"Pouso no lado escuro da Lua é mais arriscado do que no lado próximo. O terreno áspero no lado escuro pode levar a muitos problemas", apontou Sun Zezhou, projetista-chefe da Chang'e-4, da CAST.

"Mas solucionar esses problemas poderia ajudar a preparar a base para a exploração espacial futura. Um pouso de alta precisão é uma necessidade para mais explorações da Lua e asteroides. Esperamos atingir a Lua inteira e até o sistema solar inteiro", destacou Sun.

"O lado escuro da Lua tem características únicas jamais exploradas in-loco", ressaltou Zou Yongliao, diretor da divisão de exploração lunar e espaço profundo da Academia Chinesa de Ciências (ACC). "A exploração desta terra virgem pela Chang'e-4 pode gerar avanços."

A Lua é travada à Terra de acordo com a maré, rotando ao mesmo ritmo que ela orbita a Terra, por isso um lado dela pode ser visto da Terra, enquanto o outro, o lado escuro, é um mistério até agora.

Cerca de 60 anos atrás, a sonda Luna 3, da União Soviética, capturou as primeiras imagens do lado escuro da Lua. E cerca de 50 anos atrás, três astronautas da missão Apollo 8, dos EUA, se tornaram as primeiras pessoas a vê-lo com seus próprios olhos.

Os orbitadores lunares mostraram que os dois lados da Lua são muito diferentes: o lado próximo é relativamente plano, enquanto o lado escuro está densamente pontilhado com crateras de impacto de tamanhos diferentes.

Os cientistas acreditam que a crosta lunar no lado escuro seja muito mais espessa que a do lado próximo. Porém, a razão é ainda um mistério. Apenas explorações in-loco poderiam revelar os segredos.

A Lua e a Terra compartilham uma "infância" semelhante. Mas os vestígios do remoto passado na Terra foram apagados pelas atividades geológicas. "A Lua poderia fornecer algumas percepções para a história inicial da Terra", salientou Lin Yangting, um pesquisador do Instituto de Geologia e Geofísica.

Explorar a Cratera de Von Karman na Bacia SPA é importante em outro sentido. A cratera recebeu o nome de um matemático, engenheiro aeroespacial e físico húngaro-americano no século 20, que também foi professor de Qian Xuesen e Guo Yonghuai, fundadores da indústria espacial da China.

Quase 50 anos se passaram desde que o ser humano pisou pela primeira vez na Lua. Será que voltaremos a visitá-la? Como a radiação na Lua afetará os astronautas?

Cientistas da China, Alemanha e Suécia querem encontrar as respostas com a Chang'e-4, e fazer preparações para que os seres humanos retornem à Lua.

O professor Robert Wimmer-Schweingruber, do Instituto de Física Experimental e Aplicada da Universidade de Kiel na Alemanha, exaltou que preparar para a exploração humana da Lua no futuro é uma ideia excelente.

"Se os astronautas voltarem para a Terra, a radiação na Lua é o único perigo que permanece em seus corpos. Então precisamos entendê-la", ressaltou.

Johan Koehler, chefe da Ciência do Sistema Solar e Consciência de Situação do Espaço da Agência Espacial Nacional sueca, apontou que a exploração do lado escuro da Lua é uma grande conquista da China. "Estamos muito felizes por sermos parte disso."

"Existe uma teoria de que a água na superfície da Lua é formada pela interação do vento solar com o regolito da superfície. Então isso é algo que os cientistas suecos junto com os cientistas chineses querem responder", revelou Koehler.

A missão Chang'e-4, incluindo a sonda, o satélite de retransmissão Queqiao e um microssatélite orbitando a Lua, tem quatro cargas desenvolvidas através da cooperação internacional, fornecendo mais oportunidades para os cientistas do mundo e combinando o expertise humano em exploração espacial.

Para os astrônomos, o lado escuro da Lua é um lugar de tranquilidade ideal, já que o corpo da Lua protege contra a interferência de rádio procedente da Terra. Desde lá, eles podem estudar as origens e a evolução das estrelas e galáxias, tentando entender a origem do universo.

A Chang'e-4 carrega instrumentos astronômicos de rádio de baixa frequência desenvolvidos por cientistas chineses e holandeses. "Conduzir tal observação no lado escuro da Lua é um objetivo precioso há longo tempo dos astrônomos, e pode preencher lacunas na observação astronômica", disse Zou.

A sonda também levou seis espécies vivas -- algodão, colza, batata, arabidopsis, mosca-das-frutas e levedura -- para o ambiente sem vida para criar uma mini-biosfera, que deve produzir a primeira flor na Lua.

Os engenheiros espaciais chineses também planejam coletar dados ao medir constantemente as temperaturas na superfície da Lua.

"Explorar o lado escuro da Lua é uma contribuição que a China está fazendo para o mundo. Embora ainda não conheçamos o que poderíamos descobrir, esta exploração pode influenciar diversas gerações", destacou Shen Zhenrong, um projetista do explorador lunar.

Wu Weiren disse: "explorar o desconhecido é uma natureza humana. A Lua é um mundo misterioso para nós. Temos uma responsabilidade de explorá-la e entendê-la. A exploração da Lua também aprofundará nosso entendimento sobre a Terra e nós mesmos."

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