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"Nessas cinco décadas, conseguimos construir um relacionamento bilateral multidimensional e mutuamente benéfico", entrevista com Mauro Vieira, chanceler brasileiro

Fonte: Diário do Povo Online    22.11.2024 14h49

Shi Yuanhao, Diário do Povo

Ministério das Relações Exteriores do Brasil. Foto: Shi Yuanhao

"Logo após a realização do G20 no Rio de Janeiro, pretendemos concretizar a elevação de nossa parceria bilateral a outro nível. Esse processo foi iniciado em Pequim, em abril de 2023, quando o presidente Lula visitou o presidente Xi Jinping. Naquela ocasião, foram assinados 15 acordos entre os Estados, e firmados vários compromissos entre empresas e agências de Brasil e China", afirmou recentemente o Ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, em uma entrevista por escrito.

"No ano em que celebram 50 anos de relacionamento diplomático, Brasil e China têm muito a comemorar. Nessas cinco décadas, conseguimos construir um relacionamento bilateral multidimensional e mutuamente benéfico, que abrange, por exemplo, aspectos econômico-comerciais, cooperação em ciência e tecnologia e diálogo político em diversos âmbitos (como a ONU, a OMC, o G20, o BRICS, o BASIC – dedicado à coordenação em matéria de combate à mudança do clima –, o FMI e o Banco Mundial)", refere.

Vieira ressaltou que a cooperação econômica é um dos pilares mais tradicionais e bem-sucedidos das relações bilaterais, com um impressionante crescimento no comércio entre os dois países. Mais de um terço dos produtos agrícolas do Brasil são exportados para a China, e muitos alimentos consumidos na China vêm do Brasil. "Nos orgulhamos de ser um provedor confiável de alimentos de alta qualidade para a China", afirmou.

"Desde 2003, segundo o Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC), o Brasil foi o principal destino de investimentos chineses na América Latina (39% do total)", afirmou o chanceler, reforçando que "os investimentos chineses são e continuarão a ser muito bem-vindos no Brasil".

Ele destacou que o investimento chinês é crucial para o processo de industrialização do Brasil. Por um lado, os investimentos chineses nas áreas de industrialização verde e inclusiva têm impulsionado a transformação energética do Brasil. Por outro lado, os investimentos em áreas como energia eólica e solar, focados em regiões industriais mais frágeis do Brasil, ajudam a reduzir as desigualdades de desenvolvimento entre as diferentes regiões do país.

Vieira mencionou também que o Brasil acompanha de perto a Iniciativa Cinturão e Rota, e está disponível para explorar a articulação de suas estratégias de desenvolvimento, como o "Novo Programa de Aceleração de Crescimento", "Nova Indústria Brasil", “Plano de Transição Ecológica” e "Rotas de Integração Sul-Americana".

O Brasil tem vários Institutos Confúcio e um número crescente de jovens interessados em aprender chinês. O famoso músico brasileiro Gilberto Gil realizou recentemente um concerto em Shanghai. O 14º Festival Internacional de Cinema de Pequim exibiu vários filmes brasileiros; a rota aérea Pequim-Madrid-São Paulo foi reaberta, aumentando o fluxo turístico entre os dois países. Vieira mencionou diversos exemplos de intercâmbio cultural e expressou otimismo quanto ao aprofundamento das relações entre os povos dos dois países. "Tanto os chineses que vêm ao Brasil quanto os brasileiros que vão à China sentem-se acolhidos e curiosos por saber mais do outro país, e é sobre essa curiosidade que precisamos agir, facilitando os contatos pessoa-a-pessoa. Quando chegarmos ao ponto em que as sociedades de Brasil e China se conheçam melhor, daremos um novo e importante salto no relacionamento bilateral", afirmou.

A 19ª Cúpula de Líderes do G20 foi realizada com sucesso no Rio de Janeiro, Brasil. Vieira comentou que a cúpula se focou em questões como reforma da governança global, combate à fome e pobreza, desenvolvimento sustentável e transformação energética. A China tem experiências bem-sucedidas nessas áreas, oferecendo apoio importante ao Brasil e à promoção dessas agendas.

"As principais instituições de governança global – como a ONU, o FMI, o Banco Mundial – surgiram logo após a Segunda Guerra, e permaneceram mais ou menos intocadas desde então. A visão brasileira é que é necessário reformá-las, para que espelhem de forma mais fidedigna a realidade do mundo de hoje e, portanto, possam responder de forma mais eficaz aos desafios atuais", argumenta Mauro Vieira, salientando que o mundo precisa de novos mecanismos de diálogo que concedam maior voz aos países em desenvolvimento.

"Essa foi uma das prioridades da presidência brasileira do G20, neste ano, e resultou em um chamado à ação inédito no grupo em favor da reforma".

A China e o Brasil emitiram em conjunto um "consenso de seis pontos" sobre a resolução política da crise na Ucrânia e, junto com países do "Sul Global" com posições semelhantes, iniciaram a formação do grupo "Amigos da Paz" para a crise ucraniana. Ambos os países estão aprofundando sua comunicação estratégica e coordenação em questões globais, contribuindo ativamente para a paz e a estabilidade mundial. Vieira enfatizou que a paz e o desenvolvimento são interdependentes, e tanto o Brasil quanto a China mantêm diálogos sobre questões de paz e segurança mundial.

"Na China, como dizia, temos encontrado um parceiro de diálogo na reforma dessas instituições. Enquanto não ocorre a reforma ampla que o Brasil almeja, Brasil e China têm dialogado acerca do tema da paz e da segurança, de que é exemplo a proposta sino-brasileira para desescalar e encerrar o conflito russo-ucraniano", concluiu.

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