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"Colaboração Brasil-China durante a pandemia constitui um bom exemplo para a nossa relação", afirma pesquisadora brasileira

Fonte: Diário do Povo Online    15.10.2021 15h10

A brasileira Karin Costa Vazquez, economista, pesquisadora na Universidade Fudan e conselheira sênior da ONU, atualmente radicada em Shanghai, concedeu uma entrevista exclusiva ao Diário do Povo Online, onde abordou tópicos como a carta enviada pelo presidente chinês Xi Jinping aos representantes estrangeiros do Diálogo de Jovens Líderes Globais, organização que visa promover os intercâmbios entre a China e o resto do mundo, a evolução das relações entre a China e o Brasil, e a relevância da Ásia no século XXI.

A carta endereçada por Xi aos representantes estrangeiros do Diálogo de Jovens Líderes Globais, em resposta a uma correspondência enviada por esta organização, foi, segundo Costa Vazquez: "bem-vinda por duas razões. Primeiro, ela revela a abertura de Xi para a juventude, chinesa e estrangeira, e também a capacidade de inspirar essa juventude. Segundo, a capacidade de ouvir e inspirar as pessoas é uma característica essencial para a liderança do século XXI".

Vazquez considera que essas qualidades formam parte da "essência da ideia de um futuro comum para a humanidade em que competição e cooperação continuarão a coexistir, da mesma maneira que coexistem hoje e sempre coexistiram. Mas ao invés de uma corrida em direção ao abismo, a competição, daqui pra frente, tem que levar a humanidade a uma corrida para o topo, rumo a resultados positivos e transformadores”.

“Não podemos mais tolerar a desigualdade social, a depredação do meio ambiente, a pobreza no mundo. Uma competição construtiva deve ser capaz de suprir essas lacunas", avaliou ela.

Em meio à pandemia, a união de esforços assume, novamente, "uma importância redobrada". A China e o Brasil protagonizaram um exemplo dessa sintonia, unindo esforços no âmbito da saúde e vacinação. A Sinovac Biotech chegou a acordo com o Instituto Butantan para a transferência de tecnologia de produção da coronavac, permitindo que o Brasil acelerasse a produção doméstica de vacinas.

"Acredito que a colaboração Brasil-China durante a pandemia constitui um bom exemplo para a nossa relação bilateral e para o mundo. Essa experiência demonstra que a transferência de tecnologia, mais do que nunca, deve ser incluída nos acordos de cooperação", afirma.

O acordo firmado foi alcançado em um período áureo das relações entre a China e o país sul-americano, as quais têm sido gradualmente reforçadas desde o início do século.

"Lembro-me dos números em 2003, quando os fluxos comerciais entre os dois países [Brasil e China] eram de 6 bilhões de dólares anuais. Este ano atingimos o recorde de 105 bilhões de dólares, algo impressionante. Isso não só faz da China o primeiro parceiro comercial do Brasil, como deixa uma larga margem para o segundo, já para não falar do terceiro e do quarto [parceiros]", explica.

A pesquisadora ressalta, porém, que as exportações brasileiras estão cada vez mais concentradas num grupo restrito de produtos, principalmente commodities, como a soja e o minério de ferro, que apresentam elevada volatilidade de preços.

"Temos de celebrar esta relação, mas atentos no futuro para encontrar formas de diversificar e acrescentar valor às nossas exportações para a China", ressalvou.

A digitalização da economia e a transição energética, agora acontecendo na China, segundo Vazquez, proporcionarão novas oportunidades que o Brasil poderá agarrar.

O compromisso assumido pela China na Assembleia Geral da ONU no ano passado de reduzir drasticamente as emissões de carbono deixará a sua marca no mundo. A progressiva queda da dependência de combustíveis fósseis da China deverá ter impacto nas exportações brasileiras destes recursos para a China no longo prazo. Todavia, isso também irá gerar novas oportunidades, argumenta a entrevistada.

"Por exemplo, o Brasil, tendo as maiores florestas tropicais do mundo, tem um potencial imenso para gerar créditos de carbono, que podem ser transacionados no mercado internacional para ajudar a China a reduzir suas emissões. Novas oportunidades irão surgir em novos setores como, por exemplo, veículos elétricos, em que o custo das tecnologias deverá cair ao longo do tempo, passando a ser mais acessível aos países em desenvolvimento, incluindo o Brasil".

Karin aludiu ao papel desempenhado pelo Novo Banco de Desenvolvimento, cuja criação em 2015 visou "oferecer uma alternativa para as economias emergentes em todo o mundo, lideradas pelos BRICS, que financiaram projetos de desenvolvimento sustentável, de forma prática e tangível".

Residente desde 2018 em Shanghai, o centro econômico da China, a pesquisadora afirma se sentir no "epicentro de tudo o que é novidade no mundo”. Ela reconhece que “cada vez mais a Ásia está se tornando o epicentro das transformações globais. Dessa perspectiva, estar em Shanghai é particularmente estimulante".

Tendo visitado a China por várias vezes antes de iniciar sua investigação na Universidade Fudan, Karin Costa Vazquez diz que, atualmente, o que mais a impressiona é o nível de ambição e visão, não só da liderança, mas também da população para com seu país. “É algo que venho tentando compreender melhor e que se aplica à minha vida profissional e até pessoal. Acho que é muito inspirador aprender com estas experiências e tentar levá-las até meu país, o Brasil". 

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